Cinco passos para esfriar o planeta e garantir soberania alimentar
Da Via Campesina
Como a cadeia de produção global de alimentos contribui para o aquecimento global:
Desflorestamento: 15-18%
Antes que as plantações comecem, os tratores fazem seu trabalho. Pelo mundo todo, a agricultura industrial está se lançando sobre as savanas, as áreas úmidas e as florestas, lavrando uma enorme quantidade de terrenos.
A FAO diz que a expansão da fronteira agrícola é responsável por volta de 70-90% do desflorestamento global, e a metade disto para a produção de alguns poucos commodities voltados à exportação. A parte agrícola do desflorestamento contribui com 15-18% das emissões globais de Gases do Efeito Estufa
Agricultura: 11-15%
Agricultura: 11-15%
Se reconhece que a agricultura contribui com 11-15% de todos os gases estufa produzidos no mundo. A maior parte destas emissões resultam do uso de insumos industriais, como fertilizantes químicos e combustível para os tratores e maquinário agrícola, assim como o excesso de estrume gerado pela criação de gado.
Transporte: 5-6%
Transporte: 5-6%
A cadeia produtiva da alimentação atua como uma agência de viagens global. Plantações para a alimentação de animais podem ser feitas na Argentina, para alimentarem frangos no Chile, que serão exportados para a China, onde serão processados e comidos em McDonalds dos EUA.
Muita da nossa comida, produzida sob condições industriais em lugares distantes, viajam milhares de quilômetros antes de alcançarem nossos pratos. Nós podemos estimar que o transporte de comida está ligada a um quarto dos gases estufa produzidos pelo transporte mundial, ou 5-6% do total destas emissões.
Processamento e embalamento: 8-10%
O processamento é um passo altamente lucrativo da cadeia industrial do alimento. A transformação de alimentos em refeições prontas, salgadinhos e bebidas necessitam de uma enorme quantidade de energia, principalmente na forma de carbono. Assim como o embalamento e enlatamento desta comida.
Comercialização e refrigeração: 2-4%
A refrigeração é o sustentáculo das cadeias de supermercado e fast food. Onde quer que o sistema industrial de alimentos vá, a cadeia da refrigeração o acompanhará.
Considerando que a refrigeração é responsável por 15% de todo consumo de eletricidade no mundo, e que o vazamento de químicos são uma grande fonte de gases estufa, podemos dizer com segurança que a refrigeração dos alimentos contribui para cerca de 1-2% de toda a emissão de gases estufa. O comércio varejista contribui para outros 1-2%.
Desperdício: 3-4%
O sistema industrial de alimentos descarta mais da metade de toda comida que ele produz, jogada fora na longa jornada entre as fazendas e os distribuidores, os processadores de alimentos e os varejistas e restaurantes.
Boa parte do que é desperdiçado apodrece em montes de lixo e aterros sanitários, produzindo uma quantidade substantiva de gases estufa. Entre 3,5-4,5% das emissões globais destes gases vêm do lixo, e mais de 90% deles são produzidos por materiais originários do sistema de produção de comida.
Dessa forma, as medidas que devem ser tomadas para quebrar essa cadeia e tornar o planeta menos poluído, garantindo soberania alimentar, são:
1- Tomar conta do solo.
1- Tomar conta do solo.
A equação comida/clima está baseada na terra. A expansão da agricultura insustentável no século passado levou à destruição de cerca de 30-75% do material orgânico das terra aráveis, e 50% do material orgânico nas pastagens e pradarias.
Esta perda massiva de matéria orgânica é responsável por entre 25% e 40% do atual excesso de CO2 na atmosfera terrestre. Mas a boa notícia é que este CO2 que mandamos à atmosfera pode ser devolvido ao solo apenas restaurando as práticas que pequenos agricultores desenvolveram por gerações.
Se as políticas e incentivos corretos forem colocados em prática no mundo todo, a matéria orgânica do solo poderia ser restaurada a níveis pré-industriais dentro de 50 anos – que foi mais ou menos o tempo que a indústria levou para reduzi-la. Isto iria compensar entre 24% e 30% de todos os gases estufa atuais.
2- Agricultura natural, sem químicos.
O uso de químicos na agroindústria está sempre aumentando, enquanto os solos estão cada vez mais empobrecidos e as pestes estão se tornando imunes aos inseticidas e herbicidas.
O uso de químicos na agroindústria está sempre aumentando, enquanto os solos estão cada vez mais empobrecidos e as pestes estão se tornando imunes aos inseticidas e herbicidas.
No entanto, pequenos agricultores pelo mundo ainda possuem o conhecimento e a diversidade de culturas e animais para plantar produtivamente sem o uso de químicos e diversificando os sistemas, integrando agricultura e criação de animais, incorporando tudo isso à vegetação nativa.
Estas práticas aumentam a produtividade potencial da terra pois melhoram a fertilidade do solo e previnem a erosão. A cada ano mais matéria orgânica é produzida no solo, possibilitando a produção de mais e mais comida.
3- Acabar com a distância da comida e focar em alimentos frescos
A lógica corporativa que resulta nos envios de comida ao redor do mundo não faz nenhum sentido do ponto de vista ambiental ou de qualquer outra perspectiva importante.
A lógica corporativa que resulta nos envios de comida ao redor do mundo não faz nenhum sentido do ponto de vista ambiental ou de qualquer outra perspectiva importante.
O comércio global de comida, da abertura de trechos de terras e florestas para a produção de commodities agrícolas até a comida congelada vendida nos supermercados: estes são os principais culpados do sistema na contribuição às emissões de gases estufa.
Muitas das emissões do sistema poderiam ser eliminadas se a produção de comida fosse reorientada na direção dos mercados locais e dos alimentos frescos, e longe das carnes baratas e comidas processadas. Mas alcançar este patamar é provavelmente a luta mais dura, enquanto os governos e as corporações estão comprometidos com a expansão do comércio de alimentos.
4- Devolvam a terra aos agricultores e parem com as mega plantações.
Nos últimos 50 anos, 140 milhões de hectares – o tamanho de todas as terras de agricultura da Índia – foram tomados por quatro culturas que crescem predominantemente em grandes plantações: soja, dendê, canola e cana de açucar.
Nos últimos 50 anos, 140 milhões de hectares – o tamanho de todas as terras de agricultura da Índia – foram tomados por quatro culturas que crescem predominantemente em grandes plantações: soja, dendê, canola e cana de açucar.
A área global sob estes e outros commodities agrícolas – todos notáveis emissores de gases estufa – irá aumentar se as políticas públicas não mudarem. Hoje, pequenos agricultores estão espremidos em menos de um quarto das terras, mas produzem a maior parte da comida mundial – 80% de toda comida em países não-industrializados, segundo a FAO.
Pequenos agricultores produzem estes alimentos de maneira muito mais eficiente do que as grandes plantações, e de uma maneira melhor para o planeta. Uma redistribuição mundial das terras aos pequenos agricultores, combinada com políticas que ajudem a reconstruir a fertilidade do solo e políticas que apoiem os mercados locais podem reduzir os gases estufa pela metade em poucas décadas.
5- Esqueça as soluções falsas e foque no que funciona
Há um crescente reconhecimento de que a comida é central nas mudanças climáticas.
Os últimos relatórios do IPCC reconheceram que a comida e a agricultura são grandes contribuintes das emissões de gases estufa e que as mudanças climáticas impõem desafios gigantescos à nossa capacidade de alimentar uma população em crescimento. Ainda não houve nenhuma vontade política para desafiar o modelo dominante de distribuição e produção industrial de comida. Ao invés disso, os governos e corporações estão propondo inúmeras falsas soluções.
Há uma proposta vazia do Climate Smart Agriculture, que é essencialmente apenas uma repaginação da Revolução Verde. Há tecnologias novas e arriscadas como culturas geneticamente modificadas, para resistirem a secas ou projetos de geoengenharia de larga escala. Há projetos de biocombustíveis, que estão levando à grilagem de terras no Sul.
E há os mercados de carbono, que permitem que os piores agressores do meio ambiente não precisem cortar suas emissões apenas transformando florestas e a terra de camponeses e indígenas em áreas de conservação. Nenhuma destas “soluções” funcionarão, pois elas trabalham contra a única solução efetiva: uma mudança do sistema industrial globalizado de alimentos, governado pelas corporações, em direção de sistemas de alimentação locais que estejam nas mãos dos pequenos agricultores.
Tradução de Roberto Brilhante
Informe socializado pelo MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e reproduzido pelo Portal EcoDebate, 06/01/2015
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