Você realmente sabe como é produzida a melhor cachaça artesanal da Chapada? venha e conheça mais !
Para iniciar essa
matéria, é importante abordar conceitualmente, e legalmente, a sua definição.
Afinal, o que é a “cachaça” ?
O Decreto 6.871/2009, que
regulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a
padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a
fiscalização de bebidas, assim define no seu Art. 53:
“Cachaça é a
denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com graduação
alcoólica de trinta e oito a quarenta e oito por cento em volume, a vinte
graus Celsius, obtida pela destilação do mosto fermentado do caldo de
cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser
adicionada de açúcares até seis gramas por litro.
§ 1º A
cachaça que contiver açúcares em quantidade superior a seis gramas por litro e
inferior a trinta gramas por litro será denominada de cachaça adoçada.”
Consumo e produção
Segundo a EMBRAPA, a
aguardente de cana é a terceira bebiba destilada mais consumida no mundo e a
primeira no Brasil. Segundo o Programa Brasileiro de Desenvolvimento da
Aguardente de Cana, Caninha ou Cachaça (PBDAC), a produção é em torno de 1,6
bilhão de litros por ano, sendo que cerca de 75% desse total é proveniente da
fabricação industrial e 25%, da forma artesanal.
O Brasil consome quase
toda a produção de cachaça; por volta de 1% a 2 %, apenas, é exportado (2,5
milhões de litros). Os principais países compradores são: Alemanha, Paraguai,
Itália, Uruguai e Portugal.
A cultura da cana
Agora que já conhecemos a
conceituação da cachaça, vamos conhecer um pouco da produção da cana e da
cachaça.
A introdução da
cana-de-açúcar no Brasil foi parte da estratégia traçada por Portugal para
desenvolver uma atividade econômica na colônia.
A cana-de-açúcar é uma
planta totalmente aproveitada, desde a extração do caldo, para a fabricação da
cachaça, açúcar mascavo, rapadura e melado, até os seus resíduos, que são
utilizados na alimentação animal e como adubação orgânica.
O bagaço, a “ponta” da
cana e o vinhoto também são resíduos utilizados pelos agricultores no
aquecimento das fornalhas das próprias agroindústrias, e adubações de
canaviais.
As variedades de cana são
diversas, desde canas crioulas, a cana caiana, até variedades melhoradas, pelo
Instituto Agronômico de Campinas e Embrapa. Em média, a produtividade da
cana-de-açúcar no Brasil, pode variar entre 40 e 100 toneladas por hectare, se
em regiões de agricultores familiares com menos recursos, ou em grandes fazendas
da indústria sucroalcooleira que, em condições ideais e com as melhores
práticas de cultivo, pode-se obter produtividades superiores a 120 toneladas
por hectare.
Sobre as condições ideais, deve-se levar em conta uma boa variedade produtiva,
condições para irrigação localizada, controle fitossanitário, adubação, e um
clima favorável.
Regiões do sertão do
Brasil, de vales férteis de rios, aonde se tenha as estações do ano bem definidas,
com uma variação normal entre os períodos de chuva e estiagem, para melhorar o
teor de brix(açúcar) natural, são as melhores regiões para se produzir uma boa
cachaça. Não à toa, que entre as cachaças mais apreciadas, se destacam as da
região de Salinas (região da cachaça Anísio Santiago muito valorizada) e
Januária em Minas Gerais, e das regiões de Abaíra, Paramirim, Itarantim e
cabeceira do rio Utinga, na Bahia, dentre tantas outras. Não que não se possa
produzir boas cachaças também em regiões litorâneas.
Em breve descrição, falarei
tecnicamente do processo em si da fabricação da cachaça artesanal, mas,
obviamente, sem descrever o “pulo do gato”, que reside em diversas fases do
processo, como por exemplo, o ponto exato da colheita, qualidade do pé de
cocho, temperatura, tempos de fermentação e destilação, que fazem parte do
conhecimento acumulado dos bons cachaceiros! Isso mesmo, cachaceiro é aquele
que produz a cachaça. Àqueles que apreciam de forma demasiada, são denominados
de bebedores de pinga ou cachaça.
Após a colheita da cana,
faz-se o transporte para o local da moenda, que pode ser movida a tração
animal, ou motorizada, com o objetivo de extrair o caldo da cana.
Em seguida à extração, o
caldo é transportado para dornas de inox onde já está armazenado o “pé de
cocho”, que é um caldo de leveduras, que agirá para acelerar a fermentação.
Em 24 a 72 h , o produto
estará completamente fermentado e poderá ser transportado para o alambique de
cobre, onde sofrerá o processo de destilação.
A destilação, nada mais é
do que a fervura no mosto fermentado, que passa para o estado gasoso se
transformando no álcool, e posteriormente ao passar pelas serpentinas de cobre
resfriadas externamente pela água, condensam e escorrem, sendo aparado já a aguardente.
O processo de produção
não é todo uniforme. O início da destilação, é a chamada “Cabeça”, essa fração
deve ser separada, pois vem composta com metanol, resíduos de metal pesado
gerado pela estrutura do alambique, dentre outras impurezas.
A “calda” é a fração
final da destilação que é caracterizada por um percentual alcoólico reduzido,
inadequado, prevalecendo uma maior quantidade de água, esta também deverá ser
separada pois imprópria.
A boa cachaça está no
“coração”, do processo de destilação, após a separação da cabeça, e antes de
perder o teor alcóolico prevista para sua caracterização. Durante todo o
período é necessário proceder análises de graduação.
Após a destilação, a cachaça poderá ser envasada no padrão “prata”, na forma em que saiu do processo de destilação e foi transportado para dornas de inox, ou, para barris de Carvalho já curado, onde fica armazenado de forma rápida por menos de 01 ano.
O envelhecimento da cachaça artesanal, é uma arte que transforma uma bebida já saborosa em uma experiência sensorial ainda mais rica. Esse processo ocorre em barris de madeira, geralmente de carvalho ou Umburana, e é responsável por modificar a cor, o aroma e o sabor da cachaça.
Como funciona o processo:
- Escolha do barril: A madeira utilizada no barril é fundamental para o resultado final. O carvalho, por exemplo, que é o mais comum, transmite notas amadeiradas, baunilha e outras especiarias.
- Tempo de envelhecimento: O tempo de envelhecimento varia de acordo com o tipo de cachaça e o perfil de sabor desejado. Pode ir de alguns meses a muitos anos.
- Interação com a madeira: Durante o envelhecimento, a cachaça interage com a madeira do barril. A madeira libera compostos aromáticos e taninos, que são absorvidos pela bebida, modificando suas características.
- Oxigenação: A pequena quantidade de oxigênio que penetra no barril também influencia o processo, promovendo reações químicas que contribuem para a complexidade da cachaça.
Quanto mais tempo e mais criterioso é o processo de envelhecimento, mais saborosa ela fica, e consequentemente, o seu valor agregado é bem maior.
Uma cahaça “prata”, artesanal, é em média 50% mais barata que as versões ouro envelhecidas. Uma boa cachaça, custa em torno de R$ 50,00 a R$ 80,00. Envelhecida R$ 120 a R$ 150,00. Mas existem cachaças artesanais, de excelente qualidade e sabor, que são muito valorizadas como a Anísio Santiago que custa em torno de R$ 1.500,00 e a “Reserva do Lima” de Piatã, que seu preço gira em torno de R$ 400,00, a ouro.
Um aspecto muito importante é a análise da PROCEDÊNCIA.
Se você é um apreciador, é importante consumir apenas a aguardente cuja fabricação tenha procedência, pois as cachaças certificadas pelo MAPA, passam por rigorosos critérios de análise da qualidade, para obtenção da certificação, diferentes das cachaças sem rótulo e sem certificação.
Quais os problemas mais
comuns? Produtores de cachaça sem compromisso com a qualidade, podem misturar a
cabeça com a calda, ou fazer outras misturas com açúcares, água sem qualidade,
visando não perder parte da produção, os chamados desdobramentos.
Então a pessoa poderá
estar consumindo um produto tóxico e cancerígeno, como o metanol, além de metais
pesados, como resíduos de cobre, que se acumularão no organismo, pois não são
eliminados nem pelos rins e nem pelo fígado, e ao contrário, podem causar
graves problemas crônicos no fígado, que demonstram através dos pés inchados,
nesses consumidores que desconhecem os problemas.
Uma experiência bastante
exitosa em que trabalhei dando consultoria na Bahia, é a da cachaça Abaíra, originada
da articulação dos produtores de cachaça dos municípios de Piatã, Abaíra e
Jussiape. A cachaça Abaíra é referência nacional, e está sempre entre as 20
melhores do país, além de ser um dos atrativos turísticos da Chapada
Diamantina, que recebe visitantes de todo o Brasil para os Festivais da Cachaça,
e que conseguiram exportar mais de 1,5 milhão de garrafas para o mercado
europeu em 2009.
Conseguiram também a
certificação da Identificação Geográfica-IG, para a Cachaça Abaíra, produzida com
essas características acima elencadas e nessa região da Bahia.
O controle de Qualidade e
a Comercialização são realizadas pela Cooperativa dos Produtores de Derivados
de Cana-de-açúcar (Coopama) e pela Associação de Produtores de Aguardente de
Qualidade (Apama), situadas na microrregião de Abaíra que organizam em torno de
140 agricultores familiares de cachaça, comprometidos com a manutenção do
padrão de qualidade desse negócio que é um caso de sucesso.
Finalmente, para chegar ao estágio de reconhecimento que a cachaça Abaíra se
encontra hoje, foram necessários inúmeras iniciativas visando o fortalecimento
do associativismo, cooperativismo, gestão de negócios, que foram realizados por
um grupo gestor composto, pela Coopama, Apama, Empresa Baiana de
Desenvolvimento Agrícola (EBDA), e Secretaria da Agricultura (Seagri),SEBRAE,
Prefeituras dos municípios, e outras entidades parceiras e participantes do
grupo gestor do produto cana-de-açúcar.
Observação: a produção da
cachaça pode ser artesanal em alambiques de cobre, ou industriais, são as
cachaças de coluna, que fazem uma destilação industrial, como se faz o etanol
combustível. A matéria se refere ao processo de produção da cachaça artesanal,
em alambiques.
João Bosco Cavalcanti Ramalho
Eng. Agrônomo, Msc em Ecologia Aplicado à Gestão Ambiental.
Fontes:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6871.htm
EMBRAPA
-https://www.embrapa.br/agencia-de-informacao-tecnologica/cultivos/cana/pos-producao/cachaca
http://www.seagri.ba.gov.br/noticias/2008/02/14/bahia-exporta-cacha%C3%A7a-de-abaira-para-europa
http://cpu002572.ba.gov.br/noticias/2008/02/25/regi%C3%A3o-propicia-boa-aguardente
Arquivos pessoais do
entrevistado que foi consultor, entre os anos de 2.000 a 2009, Projeto UMBUZEIRO/SUDENE. Sec. Agricultura
Piatã e EBDA.
Crédito das Fotos: Ruy
Resende em 2005.
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