Em tempos de ódio , uma poesia de Luís de Camões sobre o amor...

Luís Váz de Camões



Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.


É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.


É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.


Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?



ANÁLISE DO SONETO “AMOR É FOGO QUE ARDE SEM SE VER” DE LUÍS VAZ DE CAMÕES
O soneto “Amor é fogo que arde sem se ver”, de Luís Vaz de Camões, trata de um conceito do amor na concepção do neoplatonismo, pois, acentua-se o dualismo platônico entre sensível e inteligível, matéria e espírito, finito e infinito, mundo e Deus. Este soneto é uma definição poética do amor. Como se Camões quisesse definir este sentimento indefinível e explicar o inexplicável, colocando imensos contrastes para caracterizar este “mistério”. Para Camões, o Amor (com A maiúscula) é um tipo de ideal superior, perfeito e único, pelo qual há o anseio de atingi-lo, mas como somos imperfeitos e decaídos, somos ao mesmo tempo incapazes de chegar a esse ideal. O amor é visto, então, como um sentimento que envolve sensações e que ocorre quando existe um senso de identidade entre pessoas com identidades bem definidas e diferenciadas. Existe a dualidade da incerteza do amor “físico” (com a minúscula) com o Amor ideal, assim o amor é um tipo de “imitação” do Amor, na realidade o autor procura compreender e definir o processo amoroso. Conceituando a natureza paradoxal do amor, o soneto ressalta em enunciados antitéticos, compondo um todo lógico, o caráter paradoxal do sentimento amoroso. Esclarecendo-se, entretanto, que tais contradições são, por vezes, aparentes, pois, a segunda pane de cada verso funciona como complemento da primeira, enfatizando-a por intermédio da aproximação de realidades distintas. O aspecto material, sensível “ferida que dói”, “é dor que desatina” é oposto ao espiritual “em que se sente”, “sem doer”, como, de resto pode-se observar ao longo de todo o soneto, culminando com a indagação final, a traduzir toda a perplexidade diante da total impossibilidade de se compreender o próprio amor. Camões parece estar coberto de razão ao afirmar que “tão contrário a si é o mesmo amor”, mas diversamente do percurso camoniano, ele aponta para a alma, então, o poeta parece chegar a uma conclusão, expressada pela interrogação no último terceto. A forma do soneto corresponde ao tema do poema. Podemos dizer que a primeira vista é um jogo renascentista, mas depois descobrimos o sentido profundo do poema. E nisso encontramos a arte do autor – nesta capacidade de tomar de leve (como se fosse jogo) um tema que nos faz pensar profundamente nos problemas psicológicos bastante complicados. Portanto esse soneto trata de uma verdade enunciada com aparência de mentira.

INTERTEXTUALIDADE
Monte Castelo

Legião Urbana
Composição : Renato Russo (recortes do Apóstolo Paulo e de Camões).


Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
Sem amor eu nada seria.


É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade.
O amor é bom, não quer o mal,
Não sente inveja ou se envaidece.


O amor é o fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.


Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria.


É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É um não contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder.


É um estar-se preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É um ter com quem nos mata a lealdade.
Tão contrário a si é o mesmo amor.


Estou acordado e todos dormem.
Todos dormem. Todos dormem.
Agora vejo em parte,
Mas então veremos face a face.


É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade.


Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos,
Sem amor eu nada seria.

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