Na ocasião dos 40 anos da EMBRAPA, fui convidado pelo CNPMF e CNPTC, e tanto em Aracajú, como em Cruz das Almas, tive a oportunidade de fazer uma reflexão muito parecida, com a que a EMBRAPA agora levanta, os novos desafios para além do aumento da produtividade, é reduzir a pobreza no campo!

Os novos desafios da Embrapa

Provavelmente ninguém discordará que a Embrapa simboliza uma das
conquistas mais valiosas da sociedade e do Estado brasileiros. Após quatro
décadas, é empresa que tem robusto acervo de conquistas associado à
extraordinária transformação produtiva da agropecuária do País, ainda que as
regiões rurais continuem marcadas por diversas e contraditórias faces.
De um lado, a agricultura brasileira ostenta a maior produtividade entre todos
os países com relevância agrícola. Éramos corriqueiros importadores de feijão
quando foi fundada a Embrapa, em 1973, mas atualmente exportamos uma
variada cesta de produtos para quase duas centenas de países. Em termos
reais, o valor da cesta básica caiu pela metade, assegurando melhores dietas
aos brasileiros. Por tudo isso o Brasil, sem dúvida, é e será decisivo ofertante
mundial de alimentos nos anos vindouros.
De outro, temos ainda muito a realizar. É provável que 40% dos
estabelecimentos rurais não tenham nenhuma chance de permanecer na
atividade, pois não conseguem gerar renda superior à que pode ser obtida no
trabalho urbano. Convivemos com degradantes indicadores de pobreza rural,
especialmente no Nordeste, e em todo o Brasil um terço dos produtores é
analfabeto. O seguro rural cobre meros 14% da área plantada, tornando a
atividade agrícola cada vez mais arriscada. Esses são alguns dos muitos fatos
ameaçadores que talvez expliquem por que o campo se está esvaziando,
envelhecendo e masculinizando - em face da generalizada "fuga de mulheres"
para as cidades. Igualmente grave é o fato de o emprego rural estar caindo
aceleradamente, substituído por mecanização e impulsionado pelas migrações.
Ante o mutante mundo novo que vai transformando as regiões rurais, a
Embrapa depara-se com inéditos desafios, ainda sem respostas adequadas.
Alguns são fatores externos e outros, injunções nascidas do fato de ser uma
empresa estatal. Um desafio imediato decorre da fantástica riqueza atualmente
gerada pela agropecuária, que produziu aproximadamente US$ 1 trilhão
(exportações nominais) nos últimos 25 anos. Diante dessa fábula monetária,
inúmeros agentes privados foram atraídos para os sistemas agroindustriais e
passaram a produzir tecnologias para os produtores, complementando ou
competindo diretamente com a Embrapa. Essa é uma tendência mundial e,
neste contexto, onde e como se reposicionará a empresa pública de pesquisa
agrícola? Concorrer diretamente com as firmas é impensável e insensato.
Então, o que fazer? Caso não interaja virtuosamente com as empresas
privadas ligadas à agropecuária, mantido o interesse público, a Embrapa
poderá perder seu lugar como um dos motores da agricultura moderna.
Outra hesitação atual da empresa diz respeito ao modelo tecnológico que
promoveu, nesses anos, o impressionante progresso da agropecuária
brasileira. Estão se avolumando as ações operadas por ativistas motivados por
uma palavra sedutora, porém nunca definida: agroecologia. Tais ações,
contudo, são principalmente destinadas a combater a agricultura modernizada.
É uma ofensiva incompreensível, pois se trata de um ataque à parte da
economia que sustenta o Brasil há tantos anos. Impõe-se a defesa firme e
vigorosa dos cânones científicos e da configuração tecnológica orientada para a sustentabilidade, o que vem permitindo ao País alçar-se ao panteão dos
maiores produtores de alimentos do mundo.
Um terceiro desafio está apenas nascendo, com a aprovação da Agência
Nacional de Extensão Rural e a decorrente confusão entre inovações, pesquisa
agrícola e sua transferência aos agricultores, induzindo a Embrapa
gradualmente a assumir tarefas relacionadas à assistência técnica, uma das
facetas da extensão rural. Há nessa tentativa um risco enorme, ameaçando o
riquíssimo histórico de nossa pesquisa agrícola pública. Um fato é inegável:
assistência técnica e pesquisa agrícola, quando muito, se complementam. Mas
são atividades que exigem especialização e ignorar esse fato redundará em
crescente ineficiência.
Internamente, a Embrapa defronta-se com dois desafios. Um deles diz respeito
à forte substituição de seus quadros de pesquisadores, renovados por
concursos em dois terços nos últimos dez anos. A empresa é atualmente
impulsionada por uma geração de jovens pesquisadores com excelente
formação acadêmica, mas desvinculados do passado quase épico que
constituiu a empresa e a história rural do Brasil no último meio século. É
necessário investir numa transição consistente entre as pioneiras gerações de
pesquisadores e os jovens que vão chegando, aproximando-os das
transformações atuais das regiões de produção agropecuária e, dessa forma,
estimulando agendas de pesquisa que sejam coladas às realidades agrárias e
produtivas. É tarefa urgente para a empresa. O outro desafio é mantê-la
estritamente no campo da ciência. A instituição foi organizada sob o rigor de
rituais científicos universais e a interferência de particularismos partidários e
interesses políticos representa um perigoso freio no futuro da pesquisa.
Tudo somado, e sem citar outros desafios que mereceriam análise, a Embrapa
defronta-se atualmente com uma complexa série de temas que exigem
elucidação. Como se reestruturar no novo mundo que vai conformando as
regiões rurais? É mudança que sofrerá a influência, como seria inevitável, das
disputas eleitorais em curso. Espera-se que os candidatos analisem os
obstáculos que precisam ser vencidos pela Embrapa e apoiem os dirigentes da
empresa na implantação de difíceis medidas reclamadas pelo novo momento
histórico. Se conduzidas por amplo debate e disposição sincera para o diálogo,
sem dúvida a Embrapa vai revigorar sua capacidade para situar-se com
eficácia ainda maior na nova fase do desenvolvimento agrícola brasileiro.
Zander Navarro e Eliseu Alves são pesquisadores da Embrapa. Eliseu foi
presidente da empresa (1979-1984). E-mails: zander.navarro@embrapa.br
e eliseu.alves@embrapa.br.
Obs: Segue o link para o artigo “Os Novos Desafios da Embrapa” publicado no Estado
de São Paulo EM 22/8/2014 de autoria dos Drs. Zander Navarro e Eliseu Alves.
http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,os-novos-desafios-da-embrapa-imp-
,1546563

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